Webinário com Jéssica Botelho, da CPA, e Paulo Talarico, da Agência Mural, discute como o jornalismo local enfrenta a desinformação e os estereótipos nas periferias e na Amazônia
Texto de Maria Luiza Guimarães
Como combater a desinformação que circula nas periferias urbanas e em territórios amazônicos, muitas vezes invisibilizados pela grande mídia? Esse foi o tema central do webinário promovido pela COAR Notícias, na última quarta-feira (21), que reuniu os jornalistas Paulo Talarico, da Agência Mural, e Jéssica Botelho, do Coletivo CPA, para discutir os desafios do jornalismo local diante das fake news e das vulnerabilidades informacionais.

Paulo conta que a Agência Mural surgiu em 2010, inicialmente como um blog, para fazer jornalismo sobre as periferias da Grande São Paulo sem reproduzir preconceitos. “Só somos notícia na grande mídia quando acontece violência ou tragédia. Nossa proposta é mostrar que esses territórios estão cheios de potências e histórias que precisam ser contadas”, afirma. A Mural trabalha com correspondentes locais, moradores que conhecem de perto os desafios e as soluções das próprias comunidades.
O jornalista também destaca que, embora a Agência seja digital, enfrenta dificuldades para alcançar o público nos bairros, já que os algoritmos, infelizmente, priorizam conteúdos sensacionalistas. “Nos recusamos a explorar violência para ganhar audiência. Nosso foco é criar identidade e pertencimento por meio da informação”, pontuou. Como alternativa, a Mural tem investido em ações presenciais, oficinas e projetos como o “Clube Mural”, que forma novos jornalistas das periferias, uma alternativa à comunicação offline.
Diretamente da Amazônia, Jéssica Botelho trouxe uma reflexão sobre como a região é historicamente tratada como periferia do país. “A Amazônia só aparece na mídia nacional quando é para falar de queimadas ou tragédias. Nosso território não pode existir apenas como gerador de lucro, ele é também fonte de soluções”, compartilha. Para ela, a desinformação na região se alimenta tanto da circulação de fake news quanto da ausência de produção jornalística local, configurando muitas localidades da região como desertos e semi desertos de notícias.

Além disso, Jéssica também chama atenção para um problema comum a veículos da região: a reprodução desenfreada de releases oficiais como saída para a falta de recursos. “Isso também é vetor de desinformação, principalmente nas pautas socioambientais”, alertou. A jornalista defende que o fortalecimento da comunicação popular, das rádios comunitárias e das redes locais é fundamental para enfrentar essa realidade.
O debate também abordou o papel nocivo dos programas policialescos, que reforçam estigmas e criminalizam moradores de periferias. “É um discurso que naturaliza violência, racismo e misoginia, e ainda tem grande audiência tanto na TV quanto nas plataformas digitais”, aponta Jéssica.
Ambos os jornalistas ressaltam que, apesar dos desafios, o jornalismo local é peça-chave no enfrentamento à desinformação, especialmente quando atua com formação, educação midiática e conexão direta com as comunidades. Contudo, alertam que sem políticas públicas que garantam financiamento e sustentabilidade, esse trabalho segue extremamente vulnerável. “Desinformação se combate com informação de qualidade, feita por quem vive no território para quem vive nele”, resume Paulo.
Confira o debate completo na gravação publicada no nosso canal no youtube: https://www.youtube.com/watch?v=LMxX6Yyc2s0&ab_channel=COARNot%C3%ADcias
